Começa nesta segunda-feira (12) o julgamento
de um caso que chocou a França em 2013. Uma
mãe escondeu durante dois anos um bebê de
uma gravidez indesejada no bagageiro de seu
carro. O pai alega que não sabia da existência da
criança, criada em condições extremamente
precárias até ser descoberta por mecânicos, no
sudoeste do país.
A franco-portuguesa Rosa-Maria da Cruz, de 50
anos, começa a ser julgada nesta segunda-feira por violência seguida de
mutilação ou enfermidade permanente sobre menor de 15 anos, privação de
cuidados ou alimentos comprometendo a saúde de uma criança e dissimulação
da existência de uma criança. Por esses crimes, ela pode ser condenada a até 20
anos de prisão.
O caso data de 2013 e é descrito como "um espetáculo horripilante", por um dos
homens que trabalhavam na oficina
mecânica de Terrasson, sudoeste da França,
onde uma menina de dois anos foi descoberta em um berço portátil dentro do
bagageiro de um Peugeot 307.
Coberta de excrementos, pálida, sem conseguir manter a cabeça em pé e
respirando como se estivesse sufocando, a criança foi encontrada porque a
mãe, Rosa-Maria da Cruz, parou no local para resolver um problema no carro.
Bagageiro "cheio"
Segundo os mecânicos, a mulher insistiu para que o bagageiro não fosse aberto
"porque estava cheio". Mas um dos funcionários da oficina,
Guillaume Iguacel,
de 39 anos, ficou
intrigado com gemidos vindos de dentro do veículo, que
imaginou que fossem de um animal.
Sem que a mulher percebesse, o homem resolveu chamar um colega, Denis
Latour, de 64 anos, que discretamente abriu o bagageiro e se deparou "com a
visão do horror".
Os dois homens contam que Rosa-Maria não parecia incomodada ou
constrangida com a situação. Ela chegou a consentir que a criança fosse retirada
do bagageiro para que os homens lhe dessem água.
"Quando a mãe pegou a menina no colo, foi um horror. A cabeça, os braços,
tudo estava desarticulado, seus olhos se reviravam", contou Denis Latour, à
rádio France Info.
Os dois homens acionaram a polícia e os bombeiros, que confirmam,
em seus
relatórios, que a criança foi encontrada em um ambiente "de odor pestilento, de
putrefação"
Detidos, a mãe e o pai, Domingos Sampaio Alves, também de origem
portuguesa, foram ouvidos pela polícia, a quem Rosa-Maria confessou ter
escondido por dois anos a criança – que nomeou de Serena - devido à gravidez
indesejada.
O homem garantiu não saber da existência da menina: embora o carro
permanecesse estacionado na garagem de casa, o homem não o utilizava
porque não sabe dirigir.
O casal tem outros três lhos,
com idades hoje de 11 a 17 anos. Depois da
descoberta de Serena, eles passaram um tempo sob a tutela do Estado, mas
voltaram para a casa dos pais tempos depois. Rosa-Maria não cumpriu prisão
preventiva.
Gestações indesejadas
Entrevistados pela mídia francesa, os familiares de Rosa-Maria, em Portugal,
relatam diversas gravidezes indesejadas. A gestação da terceira criança, nascida
em 2009, também foi dissimulada até quase o final.
Domingos é pedreiro e diz ter longos dias de trabalho, passar pouco tempo
com a família e quase não ter acompanhado as gravidezes de Rosa-Maria.
"Ela teve a criança em casa, praticamente em pé, na escadaria", contou ao
Libération um dos vizinhos do casal que ajudou no terceiro parto de Rosa Maria.
Ele se lembra especialmente da reação de Domingos: "quando dissemos
a ele que era uma menina, respondeu que não aguentava mais ter lhos".
Dois anos mais tarde, a história se repetiu, desta dez sem que os vizinhos
percebessem. Rosa-Maria diz ter descoberto a gravidez quando já estava no
oitavo mês de gestação, mas não contou para ninguém.
Em 24 de novembro de 2011, no começo da manhã, a franco-portuguesa deu à
luz sua quarta criança, mas sem que ninguém percebesse. "Cortei o cordão
umbilical, a segurei nos braços, z
aquela besteira, a escondi. Depois, acordei os
pequenos, os preparei para ir à escola, como se nada tivesse acontecido. (...) Me
escondi na minha mentira", contou a mulher à emissora TF1.
Serena, que completará 7 anos em alguns dias, foi adotada por outra família.
Devido aos anos que passou em isolamento dentro do bagageiro do carro, a
menina sofre de um déficit
em seu desenvolvimento físico e mental de 80% e
irreversível, segundo os especialistas.
Fonte: RFI
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