Nos
últimos anos, durante as disputas eleitorais, cresceu o discurso em defesa da
moralidade entre os mais diferentes atores políticos Brasil afora. No entanto,
na prática, as coisas são bem diferentes. Prefeitos de muitas cidades cearenses
nomearam familiares para os mais diversos cargos em suas administrações.
Os gestores se
apegam à decisão do Supremo Tribunal Federal, que não considera nepotismo a
indicação de parentes para cargos considerados políticos, como nos casos de
secretários municipais. Apesar de não ser ilegal é, no mínimo, estranho que em
uma cidade com milhares de habitantes, o prefeito encontre apenas em seus
parentes alguém com capacidade técnica para atuação nas secretarias.
O Ministério
Público (MP) e o Tribunal de Contas do Estado (TCE) entraram com diversas ações
para tentar inibir a farra das indicações de familiares nas prefeituras do
Ceará.
O Diário do Nordeste fez levantamento entre os dez maiores e os dez menores
municípios do Estado e constatou que as indicações são feitas tanto para os
cargos de secretários, como para os chamados comissionados. Foram verificados
casos de familiares de gestores nas prefeituras de Caucaia, Maracanaú, Juazeiro
do Norte, Iguatu, Itapipoca, Pacatuba, Granjeiro, Guaramiranga, Pedra Branca,
Ererê, Reriutaba, dentre outros.
Há, ainda, os
casos de “nepotismo cruzado”, quando um representante de um poder indica um
familiar para compor a estrutura de outro poder, e vice-versa. A troca,
conforme informações do Ministério Público, tem sido comum, conforme atestado
em investigações feitas ao longo dos anos.
Um dos casos
mais notáveis diz respeito à gestão do prefeito de Juazeiro do Norte, José
Arnon Cruz Bezerra de Menezes, o José Arnon, do PTB. Em 2018, o juiz Francisco
José Mazza Siqueira suspendeu a nomeação de José Roberto Celestino, cunhado de
Arnon, para o cargo de secretário Especial de Articulação Política.
O MP constatou
que a indicação de parentes do prefeito não tinha freio, configurando
nepotismo. Além de Celestino, o MP também pediu a exoneração do irmão do
prefeito, Luiz Ivan Bezerra de Menezes, do cargo de secretário Municipal do
Meio Ambiente; e Renato Fernandes Oliveira, genro de Arnon, que atuava na
Secretaria de Cultura.
O procurador do
Município, Micael François, afirma que os familiares de Arnon Bezerra não foram
indicados por serem parentes do prefeito, mas por serem qualificados para o
cargo. “É legal e eles são qualificados”, disse. O Ministério Público, porém,
faz outra avaliação do caso.
O coordenador
adjunto do Centro de Apoio Operacional da Defesa do Patrimônio Público e da
Moralidade Administrativa (Caodpp), o promotor de Justiça Silderlândio do
Nascimento, afirma que, ainda que o STF não considere como nepotismo indicações
políticas para cargos de secretários, ele diz que é necessário que o nomeado
tenha conhecimento técnico para o cargo.
“Também não
basta ter qualificação técnica, é preciso evitar abusos. Em Juazeiro do Norte,
como o prefeito não poderia indicar para outros cargos, ele criou uma
Secretaria fictícia para colocar o cunhado”, disse. Segundo o promotor, apesar
das mudanças ocorridas na sociedade brasileira nos últimos anos, o nepotismo
ainda é recorrente em praticamente todos os municípios do Estado, uma vez que
requer uma maior mudança de postura, o que estaria acontecendo aos poucos.
Grande Fortaleza
Não importa o
tamanho do município, do maior ao menor, há parentes de gestores em cargos na
Prefeitura. Em Maracanaú, na Região Metropolitana de Fortaleza (RMF), são
muitos os secretários com o sobrenome do prefeito José Firmo Camurça Neto.
Vládia de Almeida Camurça, na Secretaria de Recursos Humanos e Patrimoniais, é
irmã do prefeito. Ítalo Camurça, chefe de Gabinete, como a descrição de seu
perfil cita no site da Prefeitura, é filho de Firmo. Vanderlene de Almeida
Camurça, no Fundo Municipal de Saúde, é irmã do prefeito. Já Larissa Sousa
Torres, atual namorada de Firmo, atuava, até janeiro passado, como cargo
comissionado na Secretaria de Juventude e Lazer.
Ao Diário, a
assessoria da Prefeitura de Maracanaú disse que todas as nomeações de cargos
comissionados ou funcionários em contrato por tempo determinado “respeitam as
leis vigentes, inclusive o disposto na Súmula Vinculante nº 13 do Supremo
Tribunal Federal - STF que trata sobre o assunto do nepotismo”.
Em Itapipoca, o
prefeito João Ribeiro Barroso, do PSDB, também tem histórico de nomeação de
parentes. No ano passado, por recomendação do MP, inclusive, ele resolveu
exonerar a irmã, Margarida Ribeiro Barroso, do cargo comissionado de
Superintendente de Saúde Pública na Secretaria de Saúde de Itapipoca. No
entanto, o sobrenome da família Barroso pode ser conferido em diversos cargos
na Prefeitura atualmente.
Notificações
Iguatu e Quixadá
também receberam notificações pela contratação de familiares na gestão. No caso
de Iguatu, o prefeito Ednaldo de Lavor Couras nomeou o irmão, Francisco
Valdemir Lavor, para o cargo de supervisor especial de Transportes, lotado na
Secretaria de Governo. O sobrenome “Lavor” está presente em muitos cargos na
Prefeitura.
Segundo o
secretário de Governo de Iguatu, Tácido Cavalcanti, Valdemir de Lavor já foi
exonerado, assim como outros parentes do prefeito que estavam na gestão.
“Atendemos à orientação do Ministério Público, mesmo compreendendo que não há
impedimento legal”, disse.
Para o
secretário de Controle Externo do TCE, Raimir Holanda Filho, o grande problema
referente à existência de nepotismo é o chamado “nepotismo cruzado”, pois
segundo ele, fica mais difícil de ser detectado. “Isso acontece quando um poder
indica o familiar para outro poder e vice-versa. O trabalho acaba fincando mais
intensivo”.
Segundo Raimir,
o TCE trabalha realizando o cruzamento de dados, mas também com denúncias. O
presidente do Tribunal, Edilberto Pontes, destacou que um setor de informação
estratégica trabalha com cruzamento de dados do Estado, dos municípios e de
órgãos federais para verificar a existência de casos de nepotismo entre as
prefeituras.
“O TCE fiscaliza
tudo isso, mas nem sempre consegue captar tudo. Não consegue identificar aquele
que é parente”, disse Pontes.
Quixadá
Em Quixadá,
Ministério Público ajuizou Ação Civil Pública por ato de improbidade
administrativa contra o prefeito José Ilário Gonçalves Marques, por nepotismo.
Em 2017, o gestor, que época era presidente do Consórcio Público de Saúde de
Quixadá, designou Milton Xavier Dias Neto, genro dele, para ocupar o cargo
comissionado de diretor executivo do Consórcio
Ererê
Em 2018, o juiz
Diogo Altorbelli, de Iracema, determinou, em caráter liminar, a exoneração da
secretária de Finanças, Maria Nilani Muniz da Silva, do pequeno Município de
Ererê, por esta ser irmã do prefeito, Antônio Nivaldo Muniz da Silva, o Toinho de
Ererê
Reriutaba
Em Reriutaba, também foram cumpridas medidas liminares de afastamento de
agentes públicos por diversos delitos, dentre eles, o de nepotismo, visto que a
secretária de assistência social, Gizelli Lopes e Silva, é esposa do prefeito e
não possui qualificação específica para o cargo que ocupava
Fonte D.N
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