“Não podemos adotar a política do ódio”, adverte Camilo

Reeleito com 80% dos votos válidos em 2018, o governador do Ceará, Camilo Santana, embora filiado ao maior partido de oposição ao Governo Bolsonaro, o PT, preza pela política do diálogo e do respeito ao maior ente da Federação, a União. Diferente do governador de Pernambuco, Paulo Câmara, e do prefeito do Recife, Geraldo Júlio, ambos do PSB, que assumiram uma postura de confronto de hostilidade ao presidente, o que tem rareado os recursos federais no Estado, Santana não bate em Bolsonaro porque entende que nessa briga só quem sai perdendo é o Estado.
“O que falta ao Governo Federal é abrir mais diálogo com os setores. Porém, creio que vamos amadurecer e tirar essa questão do ódio que existe na política e dar oportunidade para que as ideias sejam respeitadas e possamos construir consensos”, prega o governador petista nesta entrevista exclusiva ao blog. Camilo Santana afirma que a moderação não faz mal a ninguém e informa que o Governo, mesmo não sendo generoso com o Nordeste, em nenhum momento criou dificuldades para o Ceará aprovar empréstimos e celebrar parcerias com a União.
“Eu sempre defendo que a relação de governantes seja de diálogo. Divergências, nós temos. Não votei nele (Bolsonaro), questiono algumas posições do seu Governo, mas tudo precisa ser feito de forma respeitosa e na defesa dos interesses da população para que seja atendida primeiramente. Quando é eleição, você pode expor suas posições, mas o momento agora é de governar, de pensar no crescimento do Brasil. Aqui, por exemplo, o presidente da FIEC (Federação das Indústrias do Estado do Ceará) votou no Bolsonaro e eu tenho uma grande relação com ele. Então, respeitar as diferenças é construir o melhor caminho”, afirmou.
Com elevados índices de aprovação, Camilo Santana chegou ao Governo do Ceará em 2014 por uma escolha do grupo dos Ferreira Gomes, até então liderado pelo ex-governador e hoje senador Cid Gomes (PDT), de quem foi secretário. O Governo do Ceará caiu nos seus braços pelo perfil de gestor e competência, porque na política não vinha de uma boa experiência em sua terra natal, Barbalha.
Ali, foi candidato à prefeito em 2000 e 2004, mas não obteve sucesso em nenhuma das candidaturas, dando espaço ao mandato de Edmundo de Sá Filho no ano de 2001, e alcançando o segundo lugar nas eleições de 2004, recebendo cerca de 9.925 votos. Santana também foi professor e coordenador da FATEC Cariri e ocupou, na condição de servidor público federal concursado, a superintendência adjunta do IBAMA no Ceará em 2003 e 2004. Também foi secretário do Desenvolvimento Agrário do Estado do Ceará no governo de Cid Gomes, de 1 de fevereiro de 2007 a 31 de dezembro de 2010.
Em 2010, foi eleito deputado estadual, sendo o mais votado do Estado, obtendo 131.171 votos. Licenciou-se para assumir a Secretaria das Cidades durante o governo de Cid Gomes em 2012. Hoje, numa manhã chuvosa em Fortaleza, ele recebeu este blogueiro e âncora do Frente a Frente pela Rede Nordeste de Rádio no Palácio da Abolição, para a seguinte entrevista:
Dá para perceber, governador, sem muito esforço que há melhorias na mobilidade, na saúde, na educação por aqui. Como o Ceará encontrou a rota do desenvolvimento?
O Ceará vive um processo de evolução. Um dos pontos mais importantes é o equilíbrio fiscal e financeiro, pois ninguém consegue investir em educação e saúde sem saúde financeira. Estamos construindo um Hospital novo, Policlínicas, UPAs, graças a esse equilíbrio. O Ceará tem sido número um em investimentos públicos no Brasil. Em 2018, fomos primeiro lugar com mais de 15% da receita líquida em investimentos.
Em 05 de agosto de 2018, Camilo Santana é homologado candidato a reeleição para o governo do estado do Ceará. Em 07 de outubro de 2018, o candidato foi reeleito com 79,96% (3.457.556 votos) Governador do Estado do Ceará, contra o seu principal adversário General Theophilo (PSDB), que obteve 488.438 votos, correspondente a 11,30% dos votos válidos.
Quanto isso representa em números reais?
Mais de R$ 3 bilhões, isso contando com recursos da União e próprios, resultado ainda de parcerias com bancos internacionais e nacionais. Isso foi e está sendo importante para o Estado evoluir, gerar empregos e oportunidades. Além disso, há um esforço na Educação. O Ceará tem avançado cada vez mais, não só no ensino fundamental, mas também na evolução do ensino médio, onde temos um dos maiores indicadores do País.
Mas Pernambuco afirma que é campeão no ensino médio...
Verdade. Estamos nesse item abaixo de Pernambuco, mas preparando o aluno do ensino fundamental para ele chegar bem no médio. Nossa estratégia foi um pouco diferente nesse sentido e os resultados estão aparecendo. Além disso, temos 35 escolas de tempo integral, que antes não tínhamos nenhuma. Existe o fortalecimento para que o Ceará tenha três Hubs. O primeiro Hub é tecnológico, já que os cabos de fibra ótica entram pelo Ceará, através do mar.
Pelo mar, governador?
Sim, vamos passar a ser o lugar mais conectado do planeta. Queremos ser um centro de inteligência e conectividade. O segundo é o Hub portuário. Firmamos uma parceria com o Porto de Roterdã, e isso tem aberto as portas do Ceará para o mundo. Transformamos o aeroporto de Fortaleza no Hub aéreo. Para isso, houve a concessão do aeroporto, que hoje está mais do que duplicado, com vôos da Air France. Saímos de oito vôos internacionais por semana para 44 e isso impactou o turismo, logicamente. Ou seja, temos traçado estratégias importantes e o Estado garante a infraestrutura. Dessa forma, a gente cria a credibilidade para dar segurança aos investidores. Tudo o que o Estado assume como compromisso, ele honra.
 João Carlos Paes Mendonça então acertou quando disso que o Ceará é uma Ilha de excelência?
Sem dúvida. João Carlos é um grande parceiro do Ceará, ganhou título de cidadão cearense e merece todas as homenagens. Em tão pouco tempo, construiu dois shoppings em Fortaleza, num momento difícil do Brasil, de crise. Mas ele, com a visão empreendedora, fez dois grandes equipamentos. Apostou no Ceará e tem tido por parte do Governo e da Prefeitura todo o apoio no sentido de criar as condições necessárias para que esses negócios sejam sustentáveis. Já o temos como um cearense, por toda relação de parceria conosco.
ACM Neto inaugurou, há pouco, um centro de convenções moderno e tem propagado como referência no Nordeste, mas soube que o daqui é muito melhor...
Em termos de tamanho, ou seja, de metros quadrados construídos, só perdemos para o de São Paulo. Mas o nosso é muito mais moderno. Isso foi estratégia do Estado, para fazer com que o turismo não seja só de férias, mas de negócios. Atraímos inúmeras feiras e eventos internacionais. É um centro de referência que atrai turistas o ano inteiro, em todas as áreas. Dessa forma, a gente melhora a hotelaria, os restaurantes e valoriza quem faz o transporte.
A mobilidade de Fortaleza está muito ligada ao ciclismo. O senhor anda de bicicleta?
No final de semana com meus filhos, no lazer, nos passeios, sim. Mas acho que pensar uma cidade, é pensar com diversidade. Com a construção da linha Sul do metrô, do VLT e com a obra da linha Leste, teremos uma intervenção triangular em Fortaleza. E isso tudo integrado com as linhas de ônibus e com a ciclovia que a Prefeitura estabeleceu. Virou uma cultura em Fortaleza e os motoristas respeitam. Tudo isso deu uma nova dinâmica. E a população sabe que tem um transporte público de qualidade. As pessoas se locomovem de maneiras mais confortável.
Por que o Ceará, especialmente, Fortaleza foram escolhidos pelo crime armado em episódios violentos dando a impressão de enfrentamento ao Estado pela bandidagem?
Quando eu assumi o Governo em 2015, a situação de violência no Ceará era muito crítica. Eu só acredito em política pública se ela for planejada. Então, eu convidei os especialistas nessa área de segurança, para que a gente construísse um sistema consistente, que passou a se chamar "Pacto por um Ceará Pacífico".
Mas Pernambuco se diz modelo bem-sucedido no Pacto pela Vida. O senhor copiou a experiência?
Eu tinha conhecimento do Pacto pela Vida criada pelo governador Eduardo Campos e chegamos a tê-lo como base, mas no nosso caso construímos o nosso próprio pacto, mais amplo e equipado.  Buscamos a parceria do poder Judiciário, Legislativo, Ministério Público, Municípios, Academia e fomos cumprindo esse plano. Eu contratei mais de 10 mil homens de segurança, investi em Inteligência, videomonitoramento, tecnologia e formamos a maior frota de aeronáutica. Depois, investimos na Justiça, e criamos um programa para que o crime fosse julgado em até um ano, diminuindo o sentimento de impunidade.
E a questão da prevenção?
Outro ponto destacado foi o trabalho de prevenção, em que todas as cidades do Ceará receberam a "Areninha", um campo sintético para o lazer, além das escolas em tempo integral, porque é uma forma de proteger o jovem. E por fim, a parte prisional. Os presídios no Brasil viraram escritório do crime. Mas a gente precisou se preparar. Eu entreguei seis novos presídios e dobrei o número de agentes penitenciários.  Fizemos cumprir a lei, com disciplina, tiramos o celular, visita íntima, botamos o preso para trabalhar. Tudo aquilo que ocorreu em janeiro do ano passado foi uma tentativa de intimidar o Estado e nós mostramos que quem mandava era o Estado. Fomos para a rua e enfrentamos com determinação e coragem.
Teve algum momento que o senhor temeu pela vida?
 Olha, a posição que a gente ocupa é de líder e precisamos estar na frente. O que eu mais me impressionei na época foi o apoio da população. Mesmo temendo, o povo colocava que estávamos no caminho certo e era a postura que deveríamos ter. Hoje, o Estado está revertendo os números. Somos o Estado que mais reduziram crimes em 2019. Mas esse combate tem que ser contínuo. A segurança no Brasil precisa ser pensada de forma mais integrada, porque extrapolou os limites dos Estados. E quem tem que articular isso é o Governo Federal. Por aqui, fazemos a nossa parte de levar Fortaleza a ser o melhor sistema prisional do País.
Os governadores têm reclamado em geral que não recebem apoio efetivo da União na gestão Bolsonaro. Isso também é uma queixa cearense?
O ano de 2019 foi um ano em que o Governo teve a justificativa que precisava para recuperar e economia. E a relação que a gente tem tido com o Governo Federal é respeitosa, institucional. Tivemos algumas dificuldades de repasse, mas recebemos recursos. Essa obra da Via Leste, por exemplo, tem R$ 600 milhões de verba federal. O cinturão das águas, que é outra obra, também foi mantido o recurso. Alguns empréstimos também foram aprovados e a relação, como eu disse, é respeitosa e isenta, mesmo sabendo que não votei no presidente. Só que quando a eleição passa, temos que governar para a população.
A postura do senhor como governador de um partido de oposição ao Governo Central é diferente, então, de Pernambuco, onde governador e o prefeito do Recife adotaram a linha de enfrentamento, do confronto. Eles estão no caminho errado?
Eu sempre defendo que a relação de governantes seja de diálogo. Divergências, nós temos. Não votei nele (Bolsonaro), questiono algumas posições do seu Governo, mas tudo precisa ser feito de forma respeitosa e na defesa dos interesses da população para que seja atendida primeiramente. Quando é eleição, você pode expor suas posições, mas o momento agora é de governar, de pensar no crescimento do Brasil. Aqui, por exemplo, o presidente da FIEC (Federação das Indústrias do Estado do Ceará) votou no Bolsonaro e eu tenho uma grande relação com ele. Então, respeitar as diferenças é construir o melhor caminho.
Qual a avaliação que o senhor faz do Governo Bolsonaro?
Acho que é cedo. Creio que é preciso mais diálogo, mais discussão das reformas com os governadores e os prefeitos das capitais. A reforma da Previdência, por exemplo, que eu defendi, precisava ser mais debatida. Aqui no Ceará, inclusive, nós fizemos a nossa própria reforma. Houve reação, mas há momentos em que precisamos tomar medidas mais duras, pelo bem da economia. O que falta ao Governo Federal é abrir mais diálogo com os setores. Porém, creio que vamos amadurecer e tirar essa questão do ódio que existe na política e dar oportunidade para que as ideias sejam respeitadas e possamos construir consensos.
O prefeito Roberto Cláudio, aliado do senhor, embora do PDT, diz que não tem ainda o nome do candidato do grupo a prefeito porque essa será uma escolha consensual com o senhor. Quais os nomes estão cotados?
Não temos nomes ainda. Agora é que nós vamos começar a discutir. A minha preocupação e a dele sempre foi governar. O importante é o processo que está em curso no Ceará. Quem vai continuar, nós vamos avaliar. Eu tiro pelo meu exemplo. Fui secretário do Governador Cid (Gomes) e escolhido para ser candidato quase na véspera. O projeto não pode ser pessoal, tem que ser do Estado. Temos avançado na educação, na economia, saúde. Vai ter o momento certo de escolher quem vai representar Fortaleza e outros municípios do nosso Estado.
Mas o PT já tem uma pré-candidata, a Luizianne Lins. O senhor é do PT e não pertence à corrente da ex-prefeita, mas garante que PT e PDT andarão juntos na sucessão em Fortaleza?
Eu sou muito otimista nisso. Não depende só do governador e do prefeito, mas sim de todo um diálogo. Eu sempre defendo que temos mais coisas em comum do que diferenças. É um momento de consolidação do projeto e trabalhar para que a gente possa construir essa aliança no Ceará e em Fortaleza.
Por Magno Martins

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